terça-feira, 23 de julho de 2019

O Segundo Sexo


Há setenta anos, Simone de Beauvoir escrevia sua mais celebre obra “ O Segundo sexo”, proclamado hino à liberdade feminina, deu pontapé inicial a luta por igualdade de gênero, em 1949, a geração pós-guerra, os chamados “Baby Boomers” nasceram em um mundo diferente das gerações anteriores as suas, um mundo em que a mulher substituiu o homem em larga escala no trabalho industrial, com esse convívio laboral e sem a supervisão dos maridos que lutavam no front, as mulheres puderam se organizar para que pudessem manter essas liberdades individuais políticas e econômicas,  mesmo após o fim do conflito, no mundo bi-polarizado que se iniciara, o conservadorismo do capitalismo ocidental lhes fechou as portas do mercado de trabalho e do acesso a educação, enquanto no bloco comunista mulheres se tornaram cientistas e engenheiras.
“A mulher tem sido objeto de um processo de diminuição desde a aurora das ciências”, frase que sintetiza a obra de Beauvoir, afirma que tanto na arte como na cultura a figura da fêmea foi inferiorizada ao longo da história.
Na passagem do período paleolítico para o neolítico, os grupos humanos passaram do nomadismo ao sedentarismo, e da caça e coleta para a domesticação dos animais e a manipulação dos grãos, a divisão de classes e de tarefas antes disso, era por gênero, os homens caçavam e as mulheres coletavam, não existia monogamia, os grupos humanos não relacionavam o sexo com a reprodução, faziam sexo por puro prazer, e a prole vinha naturalmente, cerca de 12.500 anos atrás, muito provavelmente as mulheres, inventaram a agricultura e a necessidade de se fixar em uma terra fértil, os homens passaram a capturar os animais ao invés de abatê-los, domesticando-os criaram a pecuária e o moderno termo “gigolô de vaca”, fixando-se, um primeiro homem cercou o primeiro pedaço de terra, afirmando que era seu, criando assim a propriedade privada, quando chegou a velhice, preocupou-se pela primeira vez, para quem deixaria o que construíra, nesse momento a figura do herdeiro aparece, o homem transforma a mulher também em sua propriedade para garantir que a prole tenha sua carga genética, eis que surge ai a monogamia.   
A submissão da mulher foi inserida no imaginário coletivo demonizando-as, criando bruxas feias e velhas com verrugas e que distribuem frutas envenenadas, enquanto os bruxos como Merlin, Gangalf e o jovem Harry Potter, salvam a humanidade. 
No Brasil, uma sociedade com um histórico patriarcal e eclesiástico, onde a poligamia dos nativos, e a miscigenação com primeiros degredados portugueses do século XVI, foi combatida pelo clero e pela nobreza, com a exportação de meninas órfãs de Portugal para se casarem forçadas com bandeirantes e piratas do sertão, homens de costumes bárbaros que já haviam sido deportados de terras européias, na maioria das vezes por crimes de heresia, crianças com no máximo 14 anos, vitimas do terrorismo do estado absolutista, a elite branca colonial Brasileira é herdeira da violência contra a mulher, no nosso patriarcado tropical do século XXI onde figuras publicas falam abertamente em estupro, onde a violência contra a mulher é relativizada, é possível que as relações fraternas entre casais humanos (de qualquer orientação sexual), custem a se concretizar.

A Síndrome de Gabriela


Cada dia que passa, fica mais difícil de falar sobre política no Brasil, pois o entendimento que a população tem sobre a política é desconexo da realidade, existe um senso comum de que política, em nossa democracia representativa, é vedada a uma classe de pessoas que, “supostamente”, teriam vocação para tratar de assuntos relacionados a máquina pública, sendo assim, entramos no campo do, “nós e eles”.
   Costumo perguntar para meus alunos do ensino médio, o que é política? O que eles entendem por política? E é comum, receber respostas do tipo “é roubar”, algo como uma arte, tipo crime do colarinho branco, as pessoas em geral, não se vêem representadas, até por que político é um cargo eletivo, passivo de mandato temporário, mas, uma vez que você entra, não sai mais, salvo raras exceções, então quando há eleições, para a maioria das pessoas, nós estamos mantendo cargos políticos ou encerando-os, há muito pouca rotatividade nos cargos políticos, salvo nas últimas eleições, em que houve uma aposta por parte da população por novatos, em uma tentativa compreensível de acabar com a “velha política de troca de favores”, e o resultado desta renovação está bem abaixo das nossas expectativas.
  Certa vez, arrisquei tentar explicar a origem etimológica da política há um aluno do segundo ano do ensino médio, que o termo havia surgido com as Polis Gregas da antiguidade, e a política em seus primórdios era baseada na democracia direta, o aluno respondeu que isso não era política, expliquei que se você quer entender de determinado assunto, você tem de saber sua origem e propósito, e ele me respondeu que não era isso, afirmando que não sabia o que era, mas não era aquilo. Assim fica difícil explicar algo do princípio, quando há negação da ciência, a fronteira do ciente para o não ciente cai por terra.
 A internet tem parte de culpa na desconexão da realidade quando qualquer pessoa pode expressar sua opinião sem ter nenhum argumento para defende-la, passamos para o campo do “achismo”, um neologismo cada vez mais comum no nosso cotidiano.

  O debate para nós profissionais das ciências humanas nunca foi tão difícil como ultimamente, com a geração Wikipedia baseada na pós-verdade. Isso não acontece em outras ciências, por exemplo, um dentista, nenhum leigo questiona o seu diagnóstico, pois seu conhecimento acadêmico é respeitado, ninguém chega no consultório orientando-o de qual procedimento ele deve tomar, o mesmo vale para todas as outras ciências como, engenharia, direito ou medicina, agora o professor de história e de outras ciências humanas, é sempre questionado, pois segundo os leigos, está tudo na internet, sim concordo em parte, o conteúdo das outras ciências também está disponível na internet, mas ter uma conta no facebook, participar de grupos de watsapp, e ter pacote de dados não me transforma automaticamente em doutor em nada, muito menos especialista em qualquer ciência.
  Além do “achismo” e da “pós’verdade”, convivemos com o fenômeno da “mula empacada”, ou como alguns especialistas gostam de rotular “Síndrome de Gabriela”, nome em referência a letra de Dorival Caymme, eternizada na música de Gal Costa, com o refrão “Eu nasci assim, eu cresci assim... vou ser sempre assim”, fenômeno em que o indivíduo nega todas as fontes factuais que contradizem suas convicções.
  Indaguei meu sogro no feriado de páscoa sobre as declarações do ministro da justiça, que ao conceder uma entrevista usou a palavra “conge” ao se referir a cônjuge, e o que ele achava daquilo, para minha surpresa, resumindo, ele me explicou que o  que ministro falara, estava correto, o resto do mundo que entendeu errado.    
 Tempos difíceis...      

A LEI ANTICRIME DE MORO E A LICENÇA PARA MATAR



Analisando a proposta do super ministro da justiça Sergio Moro, a que permite as forças policiais basicamente atirem primeiro e perguntem depois, essa alteração do código penal prevê que o policial pode agir em “legítima defesa” se decorrer, “medo”, “surpresa” ou “violenta emoção”,  o Brasil é o primeiro do ranking em que a polícia mais mata no mundo, onde só quem morre em confrontos com a polícia é justamente a população menos privilegiada, negra, parda e da periferia, a história de violência contra essas populações vem desde o período pré-colonial, onde os nativos foram capturados em suas aldeias e sistematicamente assassinados e escravizados, com o convívio com os colonos, essas populações entraram em contato com doenças européias que causaram grande mortalidade, a solução foi importar mão de obra do continente vizinho a África, onde os nativos já tinham contato com europeus e suas doenças desde a antiguidade sendo assim, já eram imunes. Após quatro séculos de trabalho estafante em canaviais, sob a sombra da chibata e castigos físicos para os que não alcançassem as metas de produção diárias, em 1888 veio a liberdade, após a aprovação da  Lei Áurea, se inicia um processo de criminalização da cultura negra, iniciando-se com a alteração do código penal de 1890, onde passaram a ser considerados crimes; vadiagem, mendicância e a capoeira, no processo de substituição de mão de obra, (escrava para assalariada), não estava nos planos dos cafeicultores e usineiros o uso da mão de obra disponível, pois no conceito eugenista da época, os Africanos, nativos Americanos e Asiáticos estavam abaixo dos Europeus em nível evolutivo e civilizatório, portanto foram intensificadas as políticas de imigração de Europeus, na sua maioria Alemães e Italianos, justamente refugiados de países que surgiram como estados nacionais na segunda metade do século XIX por meio de lutas internas, (qualquer semelhança com a Síria do sec. XXI não é mera coincidência), as populações de afro descendentes sobrou a periferia da sociedade e a perseguição promovida pelo estado. O Brasil tem a segunda maior população carcerária do mundo, os presídios Brasileiros tem, dois terços de sua população carcerária composta por negros, vivemos em um pais construído por mão de obra escrava negra e de recompensa o estado mata, exclui e nega a liberdade dessas populações.

                Madrugada do dia 29 de Agosto de 1993, a favela de Vigário Geral é invadida por cerca de, 36 homens encapuzados e armados que matavam quem estivesse em seu caminho, ao todo, executaram aleatoriamente, vinte e um moradores, nenhuma vitima tinha antecedentes criminais,  a Chacina de Vigário Geral foi uma maiores ocorridas no estado do Rio de Janeiro,  ocorreu como represália a morte de policiais em um confronto com traficantes locais, o caso chegou a ser julgado na Organização dos Estados Americanos (OEA) como crime contra os direitos humanos, dos 50 policiais acusados de participar do massacre apenas um foi condenado, os demais foram absolvidos por falta de provas.

                Desde nossa primeira constituição em 1824, foram adotados os três poderes, executivo, legislativo e judiciário, (em 1824 ainda tinha o poder moderador, mas não vem ao caso), ambos poderes são representados, até hoje em dia,  pela elite branca com herança escravista, se pesquisarmos a arvore genealógica dos caciques da política Brasileira, certamente vamos encontrar um escravista, segundo dados do IBGE, negros compões 54% da população Brasileira, mas ainda não tem representatividade efetiva na política nacional, pois há somente 4,2% de negros na vida publica, a falta de conscientização da população na escolha de seus representantes, ainda esbarra em conceitos históricos de cor, classe e preconceito.